Pra quem estuda o cangaço
Agora eu vou contar
Em sextilhas de cordel
Um encontro de lascar
Que aconteceu no sertão
Do Oeste potiguar.
Foi no tempo do império
Bem antes de Virgulino
Em dezoito e sete e nove
Que o cangaço nordestino
Tem datado em sua história
Esse confronto assassino.
Trata-se do grande encontro
Do Cabo Preto Limão
Com Jesuíno Brilhante:
Um herói, outro vilão
Ou um vilão, outro herói?
Eis a tal da discussão.
JESUINO BRILHANTE
Meu nome é Jesuino
Sou Brilhante, sim senhor!
Conhecido no sertão
Como um nobre vingador
Que assim como Robin Hood
Do pobre sou defensor.
PRETO LIMÃO
Esta é sua versão
Seu ‘amarelo assassino’
Pra querer ser um herói
Mas agora eu lhe ensino
O bê-á-bá dos limões
Que aprendi desde menino.
Nem se apresenta sequer
E quer logo entrar na história
Só falando o que bem quer
Diga primeiro quem é
Pois eu não sou um qualquer.
PRETO LIMÃO
Eu sou o Cabo José
O Cabo Preto Limão
Sento praça na polícia
Com esta arma na mão
Sou a vingança e a justiça
Dos negros deste sertão.
JESUINO BRILHANTE
É somente um pau mandado
A serviço do poder
Conservador deste Estado
Justiça aqui não existe
A não ser do meu ‘bargado’.
PRETO LIMÃO
Este sertão não é seu
Aqui a lei é do cão
Não se esqueça que sou livre
Mesmo em plena escravidão
Estou aqui pra vingar
A morte de mais um irmão.
JESUINO BRILHANTE
Por vingança aos limões
No cangaço eu entrei
O seu irmão Honorato
Fui eu mesmo que matei
Mas por suas desavenças
Fiz valer a minha lei.
PRETO LIMÃO
Que lei é essa, seu cabra?!
A lei de um cangaceiro
Foragido da polícia
Que se diz ser justiceiro?
Vou lhe mostrar agora
Quem manda neste terreiro
JESUINO BRILHANTE
Meu cangaço é do bem
Não sou ladrão de caprino
E nunca toco no alheio
Respeito o velho e o menino
Sou defensor da mulher
E do pobre nordestino.
Chega de contar proeza
De querer ser o mocinho
Cangaceiro é bandido
Não importa o seu caminho
Se é assim tão valente
Me enfrente agora sozinho.
JESUINO BRILHANTE
Seu Limão desaforado
Mal saísse da senzala
Como negro alforriado
E já acha então que pode
Mandar aqui no arruado.
PRETO LIMÃO
E em qualquer outro arruado:
Imperatriz, Mossoró
Patu, Brejo ou Catolé
Cangaceiro vira pó!
Pois comigo na polícia
Meu comando é um só.
JESUINO BRILHANTE
Ora, ora, quem já viu!
Um negro fujão da guerra
Da Guerra do Paraguai
Um quilombola da serra
Que matou o nosso alferes
Se achando o dono da terra
PRETO LIMÃO
Eu somente luto e mato
Pra proteger minha gente
A minha guerra é outra
Meu Brasil é diferente
Paraguai eu nem conheço
Pra botar neste repente.
JESUINO BRILHANTE
Isto aqui não é repente
É a Lei de Talião
Meu código é de honra
Com minha arma na mão
Meu verso tem sete tiros
É um pra cada Limão.
Minha arma é de aço
Desista desta peleja
Acabou o seu cangaço
Esta bala envenenada
Vai deixá-lo no bagaço.
JESUINO BRILHANTE
Já queimei o limoeiro
E um limão não faz verão
Dá um suco bem ligeiro
Pra com cachaça virar
Bebida de cangaceiro.
PRETO LIMÃO
Aqui é olho no olho
E também dente por dente
Limoeiro tem espinho
E limão deixa semente
Cangaceiro vira adubo
Ao ficar na minha frente.
JESUINO BRILHANTE
Ô negro metido a besta!
Pensa até que é eterno
Limão preto não se planta
Nem no verão nem no inverno
Porque semente daninha
Só se planta no inferno.
Mas o inferno é aqui
Seu amarelo maldito
Se pensa que vai pro céu
(O que eu não acredito)
Comece logo a rezar
Pro grande São Benedito.
JESUINO BRILHANTE
Se a justiça aqui for feita
Neste sertão que não chora
Nem pro inferno nem pro céu
Nosso encontro acaba agora
Vamos é ficar pra história
Ao chegar a nossa hora.
Mas naquele mesmo instante
Jesuino foi cercado
Pela tropa da polícia
E com destino marcado
Jesuíno teve ali
Seu cangaço sepultado.
E uma trova popular
Ecoou pelo sertão:
“Já mataram Jesuíno!
Acabou-se o valentão!
Morreu no campo de honra
Sem se entregar à prisão.
FIM
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