terça-feira, 28 de junho de 2011

O GRANDE ENCONTRO DO CANGACEIRO JESUINO BRILHANTE COM O CABO PRETO LIMÃO Autor: Gil Hollanda

Pra quem estuda o cangaço

Agora eu vou contar

Em sextilhas de cordel

Um encontro de lascar

Que aconteceu no sertão

Do Oeste potiguar.


Foi no tempo do império

Bem antes de Virgulino

Em dezoito e sete e nove

Que o cangaço nordestino

Tem datado em sua história

Esse confronto assassino.


Trata-se do grande encontro

Do Cabo Preto Limão

Com Jesuíno Brilhante:

Um herói, outro vilão

Ou um vilão, outro herói?

Eis a tal da discussão.



JESUINO BRILHANTE

Meu nome é Jesuino

Sou Brilhante, sim senhor!

Conhecido no sertão

Como um nobre vingador

Que assim como Robin Hood

Do pobre sou defensor.


PRETO LIMÃO

Esta é sua versão

Seu ‘amarelo assassino’

Pra querer ser um herói

Mas agora eu lhe ensino

O bê-á-bá dos limões

Que aprendi desde menino.


JESUÍNO BRILHANTE

Já começa o atrevimento

Nem se apresenta sequer

E quer logo entrar na história

Só falando o que bem quer

Diga primeiro quem é

Pois eu não sou um qualquer.


PRETO LIMÃO

Eu sou o Cabo José

O Cabo Preto Limão

Sento praça na polícia

Com esta arma na mão

Sou a vingança e a justiça

Dos negros deste sertão.

JESUINO BRILHANTE

Qualquer negro na polícia

É somente um pau mandado

A serviço do poder

Conservador deste Estado

Justiça aqui não existe

A não ser do meu ‘bargado’.


PRETO LIMÃO

Este sertão não é seu

Aqui a lei é do cão

Não se esqueça que sou livre

Mesmo em plena escravidão

Estou aqui pra vingar

A morte de mais um irmão.


JESUINO BRILHANTE

Por vingança aos limões

No cangaço eu entrei

O seu irmão Honorato

Fui eu mesmo que matei

Mas por suas desavenças

Fiz valer a minha lei.


PRETO LIMÃO

Que lei é essa, seu cabra?!

A lei de um cangaceiro

Foragido da polícia

Que se diz ser justiceiro?

Vou lhe mostrar agora

Quem manda neste terreiro


JESUINO BRILHANTE

Meu cangaço é do bem

Não sou ladrão de caprino

E nunca toco no alheio

Respeito o velho e o menino

Sou defensor da mulher

E do pobre nordestino.


PRETO LIMÃO

Chega de contar proeza

De querer ser o mocinho

Cangaceiro é bandido

Não importa o seu caminho

Se é assim tão valente

Me enfrente agora sozinho.


JESUINO BRILHANTE

Jagunço não é polícia

Seu Limão desaforado

Mal saísse da senzala

Como negro alforriado

E já acha então que pode

Mandar aqui no arruado.

PRETO LIMÃO

E em qualquer outro arruado:

Imperatriz, Mossoró

Patu, Brejo ou Catolé

Cangaceiro vira pó!

Pois comigo na polícia

Meu comando é um só.


JESUINO BRILHANTE

Ora, ora, quem já viu!

Um negro fujão da guerra

Da Guerra do Paraguai

Um quilombola da serra

Que matou o nosso alferes

Se achando o dono da terra


PRETO LIMÃO

Eu somente luto e mato

Pra proteger minha gente

A minha guerra é outra

Meu Brasil é diferente

Paraguai eu nem conheço

Pra botar neste repente.


JESUINO BRILHANTE

Isto aqui não é repente

É a Lei de Talião

Meu código é de honra

Com minha arma na mão

Meu verso tem sete tiros

É um pra cada Limão.


PRETO LIMÃO

Preparada a ferro e fogo

Minha arma é de aço

Desista desta peleja

Acabou o seu cangaço

Esta bala envenenada

Vai deixá-lo no bagaço.


JESUINO BRILHANTE

bagaço vou deixá-lo

Já queimei o limoeiro

E um limão não faz verão

Dá um suco bem ligeiro

Pra com cachaça virar

Bebida de cangaceiro.

PRETO LIMÃO

Aqui é olho no olho

E também dente por dente

Limoeiro tem espinho

E limão deixa semente

Cangaceiro vira adubo

Ao ficar na minha frente.


JESUINO BRILHANTE

Ô negro metido a besta!

Pensa até que é eterno

Limão preto não se planta

Nem no verão nem no inverno

Porque semente daninha

Só se planta no inferno.


PRETO LIMÃO

Mas o inferno é aqui

Seu amarelo maldito

Se pensa que vai pro céu

(O que eu não acredito)

Comece logo a rezar

Pro grande São Benedito.


JESUINO BRILHANTE

Se a justiça aqui for feita

Neste sertão que não chora

Nem pro inferno nem pro céu

Nosso encontro acaba agora

Vamos é ficar pra história

Ao chegar a nossa hora.


Mas naquele mesmo instante

Jesuino foi cercado

Pela tropa da polícia

E com destino marcado

Jesuíno teve ali

Seu cangaço sepultado.


E uma trova popular

Ecoou pelo sertão:

“Já mataram Jesuíno!

Acabou-se o valentão!

Morreu no campo de honra

Sem se entregar à prisão.


FIM

segunda-feira, 13 de junho de 2011

O LIVRO AMARELO - Hailton Mangabeira


O LIVRO AMARELO

(Hailton Mangabeira)


Que história emocionante,

É essa que vou contar,

Quero logo ressaltar,

Tem um grande ensinamento,

E digo nesse momento,

Eu até me emocionei,

Quantas vezes eu parei,

Quando tava escrevendo,

A lágrima ia descendo,

Noutras nem mesmo notei.


Quando ele era pequeno,

Todo dia era certo,

Seu pai chamava pra perto,

E sentava-se no chão,

E com muita atenção,

No tamborete sentado,

Ficava até emocionado,

Na hora da contação,

Não sabia da razão,

Nem porque do seu estado.


Era um livro amarelo,

Que o seu pai sempre lia,

Momentos de alegria,

Que ele foi se acostumando,

E ficava esperando,

Pra essa hora chegar,

Ele ia pro seu lugar,

Chega ficava babando,

Na história viajando,

Pegava-se a recordar.


Era tanta da história,

Tinha fada e guerreiro,

Fazendeiro e vaqueiro,

Tinha rico, tinha pobre,

De camponês e de nobre,

De amor, de sentimento,

De saudade, de tormento,

De tristeza, de alegria,

De sonho, de fantasia,

Se fazia de momento.


Foi então que foi chegado,

O tempo de ir estudar,

Começou a soletrar,

As letras do alfabeto,

O mundo ficava aberto,

Mas seu pai continuava,

Uma história bem contada,

Todo dia acontecia,

Suscitava alegria,

É mesmo conto de fada.


Teve um dia que seu pai,

Que uma capa colocou,

E desta forma falou:

Que era pro livro zelar,

Mas não deixou de contar,

As histórias todo dia,

E nessa hora se via,

Cheio de satisfação,

Muita paz no coração,

Era como se sentia.


Terminada a leitura,

O livro seu pai guardava,

E depois que se deitava,

Dormia um sono profundo,

A melhor coisa do mundo,

Acordava bem cedinho,

Recoberto de carinho,

Ele saia pra escola,

O caderno na sacola,

E pegava o caminho.


Por obedecer seu pai,

Só ficava na vontade,

O que queria de verdade,

Era o livro pra pegar,

E nele regozijar,

Fazer uma releitura,

No seu mundo de aventura,

Mas nunca nele pegou,

Pois seu pai nunca deixou,

Sem perder a compostura.


O menino foi crescendo,

Foi tornando-se um rapaz,

E cada vez mais capaz,

Vivia se destacando,

Na escola, um encanto,

A lição que adorava,

Quando o professor falava,

Ele tudo já sabia,

E de pronto respondia,

Aquilo que perguntava.


E quando ele ficou adulto,

Consagrou-se escritor,

De nível superior,

Um talento invejável,

Isso era inevitável,

Pois teve uma base boa,

E olhe, que não foi à toa,

Pois seu pai propiciou,

Cedinho condicionou,

Para ser boa pessoa.


Pois gostava de leitura,

Ao seu pai se igualava,

A cada dia se mostrava,

Mais e mais inteligente,

Um exímio competente,

Das letras, um arquiteto,

As palavras, objeto,

Pois era o seu labutar,

Sem sequer pestanejar,

Fazia de tudo correto.


E foi embora pra longe,

O destino quis assim,

E não pense que é o fim,

Do mundo, um cidadão,

De grande repercussão,

E Vivendo a viajar,

Conheceu cada lugar,

Na imensidão do planeta,

Ligeiro como cometa,

É como os olhos piscar.


Um dia numa palestra,

Seu telefone tocou,

E aquilo que ele escutou,

Parou a respiração,

Bateu forte o coração,

A notícia entristeceu,

Foi que seu pai faleceu,

Sem ao menos esperar,

Um dia ele voltar,

De volta pro braço seu.


Pra contar mais uma história,

Aquelas de antigamente,

E sentiu profundamente,

Uma perda irreparável,

Era dano incalculável,

Nem doutor daria jeito,

Pois na vida dum sujeito,

Que o pai e mãe perdeu,

E sabe como sofreu,

As causas desse efeito.


No instante, na lembrança,

Reviveu a trajetória,

Com seu pai, cada história,

Naquela casa humilde,

Parecendo como filme,

As cenas iam passando,

E que ele ali recordando,

Numa fração de segundo,

Do outro lado do mundo,

O passado foi chegando.


Lembrou do livro amarelo,

O eterno companheiro,

Valia mais que dinheiro,

Pois foi como iniciou,

Nas letras e recordou,

Na hora que lá chegar,

Ligeiro vou procurar,

Vai ser a minha herança,

Do meu tempo de criança,

Pro meu filho recontar.


E chegando a tristeza,

Abateu seu coração,

E sentiu forte emoção,

Pois seu pai já não estava,

Aquele que tanto amava,

Que lhe dava segurança,

Só carinho e esperança,

Levaram ao mausoléu,

E certamente pro céu,

Era homem de bonança.


Soltando a mala no chão,

E do livro se lembrou,

As histórias rebuscou,

Começou a procurar,

Pois sabia do lugar,

Onde seu pai guardava,

No camiseiro, na mala,

Depois de cada leitura,

Início duma cultura,

Até hoje cultivada.


O cheiro daquela casa,

Trazia-lhe recordação,

Nessa hora o coração,

Foi batendo acelerado,

Forte e descompassado,

Que chegou a incomodar,

Só em ele observar,

Que o camiseiro lá estava,

E dentro tinha uma mala,

Faltava-lhe até o ar.


Aquele espaço humilde

Guardando o livro amarelo,

Singular e bem singelo,

Pegou a mala na Mão,

Sentiu forte emoção,

E a mala foi abrindo,

O passado vinha vindo,

Um momento precioso,

Ou até mais glorioso,

A voz do seu pai ouvindo.


Quando ele viu o livro,

Do mesmo jeito estava,

Protegido pela mala,

Sem qualquer alteração,

Tinha ainda a proteção,

Da cobertura da capa,

E foi nessa mesma etapa,

Que ele antes de abrir,

Queria redescobrir,

De novo aquela capa.


Mais antes de retirar,

O papel da cobertura,

Fez ele uma mistura,

De passado e de presente,

E agora finalmente,

Ele iria conhecer,

O livro, seu bem querer,

Foi rasgando o que cobria,

O amarelo aparecia,

E ele pôde perceber.


Foi grande sua surpresa,

Ao livro observar,

Não dava pra acreditar,

Era uma lista telefônica,

Uma idéia desarmônica,

Não podia entender,

O que tava acontecer,

E tudo que o pai contava,

De onde ele tirava,

Quase não podia crer.


Em conversa com parentes,

Então ele descobriu,

Forte emoção sucumbiu,

Que seu pai não sabia ler,

E para compreender,

Qual era a motivação,

Do seu pai, qual a razão,

De histórias inventar,

Pra fazer me alegrar,

Fez-se essa a questão.


Na verdade o seu pai,

Tinha preocupação,

De formar um cidadão,

Capaz de compreender,

Pois sabia que o ler,

Na verdade libertava,

Por isso que ele inventava,

Pro filho acostumar,

Leitura valorizar,

Ter flores na caminhada.


Foi onde caiu a ficha,

Foi aonde compreendeu,

Tudo o que aconteceu,

Aquilo que o pai fazia,

Na busca da primazia,

Insigne contador,

Do filho fez um leitor,

Foi seu pai o seu começo,

Educação vem de berço,

Com carinho e com amor.


Pra você, papai, mamãe,

Antes do filho dormir,

E ao invés de assistir,

A novela indecente,

Pense e faça diferente,

E pegue um livro que tem,

Contando e faça também,

Ou escolha uma história,

Ou invente na memória,

Que os anjos dizem amém.